O alinhamento dos planetas no ano 2000, será o novo "fim do mundo"?

"Le monde va finir. La seule raison pour

laquelle il pourrait durer, c'est qu'il existe" (*)

Baudelaire (1821-1867), Diários Íntimos.

 

Um ano após o notável reagrupamento planetário de fevereiro de 1999, quando os planetas Vênus e Júpiter e Saturno estiveram muito próximos entre si, no ano 2000, os dois gigantes do sistema solar - Júpiter e Saturno - deslocam-se novamente para o céu crepuscular.

Vênus, visível antes do nascer do Sol, no fim do verão, cedeu sua posição ao lado de Saturno e Júpiter ao planeta Marte que, apesar de menos luminoso que Vênus, possui uma acentuada coloração avermelhada. Realmente, um pouco de sua próxima oposição - 13 de junho de 2001 - a magnitude do planeta vermelho está próxima de + 1,4. Portanto, será necessário que o crepúsculo esteja suficientemente escuro para ser possível distingui-lo a olho nu, mas com um binóculo será fácil de observá-lo, um quarto de hora depois do pôr do Sol, num céu limpo, sem nebulosidade, ao lado de Júpiter e Saturno. Eles permanecerão até meados de abril circunscritos num círculo de cinco graus de diâmetro. Dois períodos serão particularmente espetaculares para os observadores: o de 7 a 10 de março e, mais tarde, de 5 a 7 de abril, quando um fino crescente de uma jovem Lua, dominada pela luz cinzenta, se deslocará nas proximidades desse trio planetário. Em março, será possível acompanhar a aproximação aparente de Saturno a Marte, passando por Júpiter. Em 22 de março, planetas menos brilhantes, situados de cada lado de Júpiter, parecerão como se fossem duas pedras preciosas que um joalheiro celeste tivesse colocados a igual distância de Júpiter, com o objetivo de acentuar a pureza do seu brilho. Ainda no dia 6 de abril, este planeta se aproximará de 1º06' de Marte. Nesta mesma noite, uma meia hora após o pôr do Sol, será possível contemplar o crescente lunar a 5º ao lado de Saturno a pouco menos de 5º acima.

O termo "conjunção" é, com freqüência, empregado num sentido muito amplo para indicar que dois corpos, em geral do sistema solar, se encontram muito próximos entre si, no céu. Às vezes, este vocábulo é usado, em uma linguagem pseudo-científica e de vulgarização, pelos astrólogos de um modo totalmente impróprio. É o caso das célebres "conjunção de todos os planetas", como ocorreu em março de 1982. Para qualificar este fenômeno os astrônomos John Gribbin e S. Plegemann, em sua obra Júpiter effect (1974), cunharam o vocábulo superconjunction (superconjunção). Segundo estes dois autores um alinhamento de todos os planetas; inclusive a Terra, deveria produzir eventos catastróficos sobre a atividade solar e indiretamente um aumento da atividade sísmica.

Na realidade, em 1982, não ocorreu nenhum alinhamento propriamente dito, mesmo aproximativo, de todos os planetas; o que ocorreu - fato igualmente raro - foi a reunião de todos os planetas dentro de um setor com centro no Sol. Em 10 de maio de 1982, o setor foi de 95º. Compare-se com o que ocorreu em 11 de abril de 1128 quando o setor foi de 40º.

(*)"O mundo vai acabar. A única

razão pela qual poderia durar é

que ele existe"

Em qualquer destes dois casos falar de um alinhamento ou de conjunção é uma ousadia pouco compreensível para quem se dedica à ciência. Apesar disso, Gribbin e Plagemann previram a possibilidade da ocorrência de eventos catastróficos produzidos sobre a Terra em virtude de um aumento da atividade solar em conseqüência desse alinhamento sui-generis de 95º. A lógica desses dois astrofísicos baseava-se nos seguintes fatos:

1º. A ação de maré exercida sobre o Sol pelos planetas alinhados como em 1982 atingiu um máximo;

2º. Essa ação provoca uma superabundância de manchas solares;

3º. Um número acentuado de manchas solares significam uma maior probabilidade de erupções solares, durante as quais um maior número de partículas (prótons, elétrons, etc.) atingem as altas camadas da atmosfera terrestre;

4º. Estas partículas provocam movimentos de uma grande massa de ar, que por sua vez influenciam a velocidade de rotação da Terra;

5º. Uma tal variação de velocidade pode causar tremores de Terra.

Na verdade, esta cadeia sucessiva de ocorrências de tal sorte é pouco provável, mesmo no caso de um autêntico alinhamento.

 

Os "alinhamentos planetários" através da história

Na Idade Média, mais precisamente no século XII, ocorreu uma notável conjunção de todos os planetas quase análoga à que irá ocorrer no ano 2000. Ambas foram precedidas seis meses antes por um eclipse do Sol, o que contribuiu ainda mais para aumentar o alarde em torno do fenômeno. Todos os astrônomos da época, mais astrólogos que cientistas, anunciaram a ocorrência de enormes catástrofes que poderiam, segundo certas afirmativas, conduzir a total destruição da Terra e mesmo ao fim do mundo.

Comentando a conjunção do século XII, o astrônomo francês Joseph J. Le François de Lalande (1732-1807) em sua Histoire abrégée de l'Astronomie (1801), após determinar a data exata de tal fenômeno, ocorrido em 15 de setembro de 1186, segundo seus cálculos, observou serem tais conjunções, na verdade, aproximações de planetas numa mesma região do céu.

Para conjunção  rigorosa, Lalande escreveu "utilizando somente o período de revolução dos planetas em dias, encontrei 17 mil milhões de milhões de anos para o intervalo entre uma conjunção e outra. O que seria se tivesse levado em consideração as horas e os minutos?" Apesar de não se tratar de um alinhamento no sentido da palavra, essa "louca previsão", como escreveu o astrônomo francês Jean-Baptiste Joseph Delambre (1749-1822), em sua Histoire de l'Astronomie du Moyen Age (1819), causou consternação geral junto ao povo, na época, pois os profetas previram que com o fenômeno ocorreria o fim do mundo.

Parece que a humanidade esquece facilmente as armadilhas do destino. Embora sua memória seja fraca, sua capacidade de se emocionar é rapidamente inflamável. Assim, em 1919, a credulidade do povo foi de novo manipulada quando se anunciava o fim do mundo como conseqüência do aparecimento simultâneo e muito próximo entre si de todos os planetas durante a madrugada de 17 de setembro. Numa avalancha de rumores, surgiram as afirmativas mais incríveis, dentre elas a de um astrônomo argentino, Albert Porta, que afirmava serem as manchas solares produzidas pela atração gravitacional dos planetas. Em entrevista publicada no Washington Herald, Porta anunciou que a conjunção de todos os planetas com o Sol, em 17 e 20 de dezembro de 1919, segundo os seus cálculos, iria produzir uma série de catástrofes. 0 nosso planeta, afirmava, seria sacudido por abalos sísmicos, maremotos e furacões jamais vistos. Durante esses dois dias, uma enorme mancha visível a olho nu surgiria na superfície solar. Na época, o astrônomo e escritor Camille Flammarion (1842-1925), procurou esclarecer a falta de base científica do fenômeno lembrando que nada iria ocorrer em um célebre artigo publicado quatro dias antes, na revista Illustration. Até mesmo o célebre compositor Camille Saint-Sains, que também foi astrônomo amador e membro da Societé Astronomique de France, lembrou na ocasião que já havia admirado fenômeno análogo de indizível beleza, em Las Palmas, nas Canárias. De fato, alguns anos antes, em setembro de 1901, todos os planetas tinham estado alinhados na constelação de Sagitário, com exceção de Netuno, que se encontrava na ocasião em oposição aos outros. Convém lembrar que, em 10 de maio de 1941, ocorreu uma importante conjunção de cinco planetas, Mercúrio, Vênus, Júpiter, Saturno e Urano, com o Sol na constelação do Touro (Taurus).

A "superconjunção" de todos planetas.

Desde o ano zero até o ano 3000, os nove planetas estiveram e estarão situados no interior de um setor heliocêntrico de 90 graus nas seguintes datas; em 12 de janeiro de 449; em 06 de maio de 2492 e em 22 de outubro de 2520. Em 1 de fevereiro de 949, os nove planetas formaram um setor de 80 graus de longitude celeste e em 21 de julho de 2992 um  ângulo de 73 graus. Com exclusão de Plutão, para o mesmo período de 0 a 3000 anos, as seguintes "superconjunções" já ocorreram ou irão ocorrer:

Tabela I - Superconjunção de todos os planetas

Data

Ângulo

Início

Fim

117 Nov. 29

74

Nov. 19

Dez. 04

310 Mar. 08

87

Mar. 06

Mar.13

410 Set. 22

87

Set. 11

Set. 24

449 Jan. 22

57

Jan.16

Fev.13

626 Fev. 11

84

Fev. 02

Fev.14

628 Jan. 23

65

Jan. 02

Fev.05

768 Nov. 17

86

Nov. 16

Nov.26

949 Fev. 01

80

Jan. 20

Fev.04

987 Jun. 28

66

Maio. 28

Jul.07

989 Jun. 08

76

Maio. 07

Jun.12

1126 Maio. 09

83

Maio. 01

Maio.17

1128 Abr.11

40

Mar. 30

Maio. 10

1130 Mar.18

84

Mar. 16

Mar. 29

1166 Ago.31

72

Ago. 21

Set. 13

1307 Abr.14

46

Mar. 18

Maio. 09

1666 Set.19

85

Set. 14

Out. 03

1817 Jun.09

83

Jun. 14

Jun. 22

2161 Maio.19

69

Abr. 29

Jun. 02

2176 Nov.07

78

Nov. 04

Nov. 24

2492 Maio.06

90

Abr. 29

Maio. 07

2520 out. 22

90

Out. 04

Out. 23

2851 Set. 30

82

Set. 15

Out. 01

2892 Jan.06

82

Jan.01

Jan.20

2992 Jul.21

73

Jul.08

Ago.06

 

A conjunção dos sete "planetas" antigos

Se considerarmos os "agrupamentos" do Sol, Lua e dos cinco planetas visíveis a olho nu no interior de um setor de 30º de longitude celeste, teremos uma série (tabela II) na qual aparece o agrupamento de 5 de maio de 2000:

Tabela II: Conjunção dos sete "planetas" dos antigos

Data

Constelação

Separação

Eclipse

1007 ago. 15.0

Leão

21º

Não

1186 set. 15.0

Virgem

12º

Parcial

1284 dez. 10.0

Sagitário

28º

Anular

1285 jan. 6.5

Capricórnio

29º

Não

1483 out. 30.0

Libra

27º

Não

1524 fev. 5.0

Aquário

24º

Anular

1624 set. 11.0

Leão

27º

Parcial

1662 dez. 10.0

Ofiúco

25º

Não

1821 abr. 2.5

Peixes

21º

Não

1821 abr. 30.5

Peixes

26º

Não

1962 fev. 5.0

Capricórnio

16º

Total

2000 maio 5.0

Áries

26º

Não

2040 set. 8.0

Virgem

29º

Não

2100 nov. 2.0

Virgem

29º

Não

 

O efeito Júpiter

Considerando a Tabela II, verificamos que no passado ocorrem "agrupamentos" com "influência" muito maior sobre a Terra do que a "superconjunção" de 1982. Entretanto nenhuma catástrofe ocorreu. Todavia, nada impediu que voltássemos às mesmas hipóteses alucinantes. Só que a roupagem cientifica é outra. Tudo começou em 1974, com a publicação do livro intitulado The Jupiter Effect (O Efeito Júpiter) de autoria de dois eminentes cientistas, com prefácio do químico e escritor norte-americano lsaac Asimov (1920-1992). O primeiro, John R. Gribbin, além de editor de Nature, uma das maiores revistas científicas internacionais, publicada em Londres, é doutor em astrofísica pela Universidade de Cambridge, na Inglaterra. O segundo, Stephen Plagemann, físico da Universidade da Califórnia, em Berkeley, recebeu em 1971 o seu doutorado na Universidade de Cambridge, onde trabalhou no Instituto de Astronomia Teórica, com o eminente astrofísico e escritor Sir Fred Hoyle (1915- ). Plagemann, que atualmente reside em Washington, colaborou em importantes projetos espaciais no U.S. Geological Survey e com a NASA.

As idéias expostas por esses dois cientistas se resumiam na seguinte seqüência de efeitos. Em primeiro lugar, supõem que a força de maré produzida pelos planetas alinhados de um mesmo lado do Sol atingiria um nível que, além de causar o aparecimento de um maior número de manchas solares, aumentaria de modo sensível a atividade eruptiva na superfície do Sol. Em conseqüência dessa maior atividade solar, uma superabundância de radiações e partículas provenientes do Sol atingiria a alta atmosfera terrestre, provocando um movimento anormal das massas de ar. Ora, um tal movimento na atmosfera produziria uma desaceleração no movimento de rotação da Terra, em virtude do atrito das massas de ar com a superfície terrestre. Por outro lado, em virtude desses efeitos, a probabilidade de ocorrerem terremotos nessa época seria maior.

Na elaboração dessa seqüência de eventos, Gribbin e Piagemann basearam-se principalmente nos estudos do astrônomo inglês R. D. Wood, que em 1972, teria descoberto a existência de uma correlação entre a atividade solar e as forças da maré produzidas na superfície solar pelos planetas. Para evidenciar o efeito da atividade solar sobre a rotação terrestre, serviram-se das conclusões a que chegou o astrônomo francês André Danjon (1890-1967); este, observando com um astrolábio de sua concepção, teria detectado, em 1959, uma brusca e inexplicável variação no movimento da rotação terrestre. Como nessa ocasião ocorreu, também uma intensa erupção solar, Danjon elaborou a hipótese de que a atividade solar seria o agente responsável por tal brusca variação na rotação da Terra. Chegou mesmo a sugerir um mecanismo provável para tal influencia que se faria através do vento solar e do campo magnético terrestre. No entanto essas duas hipóteses, tanto a da influencia gravitacional dos planetas sobre a atividade solar como o da ação das erupções do Sol sobre a rotação terrestre, são correlações ainda não comprovadas em definitivo. De fato, considerando que os efeitos de tais marés planetárias são muito fracos, da ordem de 1 milímetro na superfície solar e, por outro lado, sabendo-se que o efeito sobre a rotação terrestre só foi até hoje registrado por um único observador, Danjon, somos conduzidos a minimizar o valor científico dessas hipóteses.

Na realidade, um outro ponto fraco da hipótese catastrófica de Gribbin e Plagemann, em seu livro The Jupiter Effect, foi a anunciada superconjunção de 1982, de Júpiter, Saturno, Urano e Netuno. Na realidade, essas superconjunções que ocorrem a cada 178,73 anos são aproximativas, pois o ângulo máximo formado por esses planetas não será jamais inferior a 40º e, em 1982, foi de 95º. Não se entende como foi possível denominar tal evento de "superconjunção". Além do mais, os efeitos de Saturno, Urano e Netuno são desprezíveis. Muito mais importante seriam os efeitos conjuntos dos planetas Júpiter (pela sua massa, apesar da enorme distância do Sol), Vênus e Mercúrio (em virtude de suas distâncias muito próximas do Sol).

Considerando-se que o efeito de maré deveria produzir duas elevações simétricas sobre o globo solar, uma no ponto subplanetário e outra no lado diametralmente oposto, não seria necessário que os planetas estivessem do mesmo lado do Sol, como afirmaram Gribbin e Plagemann, para que a atração planetária fosse mais intensa.

Analisando as ocorrências de terremotos, Gribbin e Plagemann encontraram uma considerável atividade cuja periodicidade é de 179 anos, período das "superconjunções". Talvez desconhecessem os nossos eminentes astrofísicos o estudo do geofísico belga Van Gils, do Observatório Real da Bélgica, que ao estudar 21.873 terremotos registrados em Uccle (Bélgica) e em De Belt (Holanda) com a atividade solar não encontrou nenhuma relação entre os dois fenômenos. Aliás, preocupado com as afirmativas contidas no livro Efeito Júpiter, o sismólogo norte-americano W. H. Ip relatou na revista Icarus, recentemente, o estudo do seu colega chinês Yu Shen que, após dividir o período de 780 a.C. até‚ hoje, em anos calmos e ativos quanto aos abalos sísmicos, concluiu que a atividade solar e os terremotos são fenômenos independentes. Assim, as dramáticas previsões com relação aos efeitos do alinhamento dos planetas sobre a falha de Santo André, na Califórnia, deixam de possuir qualquer valor científico. Na realidade, a falha de Santo André‚ irá  se deslocar no futuro; no entanto, isso poder ocorrer em qualquer outro ano que não seja 1982.

Convém lembrar mais uma vez que as influências da ação gravitacional dos planetas no aparecimento das manchas solares, assim como a influência da atividade solar sobre a rotação terrestre, não são novidades deste século como sugerem os dois cientistas. Já  em meados do século XIX, o astrônomo Warren de la Rue (1815-1889), do Observatório Kiev, e o holandês Hoek, do Observatório de Utrecht, como nos relatou o astrônomo francês Camille Flammarion, no terceiro volume de sua obra Études et Lectures sur l'Astronomie (1872), concluíram que tal influência dependeria principalmente de Júpiter e Vênus. Tais correlações já  foram estudadas também pelo astrônomo tcheco Link, há  mais de 30 anos.

O alinhamento dos planetas anunciado por Gribbin e Plageman como sendo um alinhamento fora do comum, onde cada planeta esteve em conjunção com todos os outros, ou seja, quando todos os planetas estiveram alinhados de um mesmo lado do Sol, constituiu, na realidade, a reunião aparente dos nove planetas no interior de um setor de cerca de 95 graus. De fato, não ocorreu um alinhamento, isto é‚ um planeta atrás do outro, em fila indiana, como sugeriram os astrofísicos ingleses. O que ocorreu foi a reunião de todos os planetas em uma faixa do céu,  às 20h 32min (hora de Brasília) do dia 10 de março de 1982. Como a essa hora nem todos os planetas visíveis a olho nu estavam acima do nosso horizonte, só foi possível observá-los a partir das quatro da madrugada às vésperas do dia dez de março ou nos dias subseqüentes. Convém lembrar que esse fenômeno pode ser acompanhado desde janeiro até o fim do mês de maio. Na época, encontravam-se na constelação de Virgem, visíveis logo após a meia noite, os planetas Marte, Júpiter e Saturno. Foi fácil localizá-los em virtude da coloração vermelho-alaranjada do planeta Marte. Dos dois outros planetas visíveis a olho nu, Mercúrio estava na constelação de Capricórnio e Vênus, na constelação de Sagitário. Os outros planetas visíveis ao telescópio, Urano e Netuno, estavam: o primeiro na constelação de Escorpião, e o segundo na constelação de Ofiúco; Plutão, visível somente pela fotografia, estava nos limites das constelações de Virgem e Boeiro.

Os efeitos de maré

Ao anunciarem a sua hipótese, em 1974, os astrofísicos Gribbin e Plagemann, imaginaram que o alinhamento dos planetas em 1982 poderia provocar um aumento muito intenso dos efeitos de maré no Sol e na Terra. As marés no Sol e na Terra provocariam, respectivamente, um aumento de proporções catastróficas na atividade solar e na freqüência dos terremotos e maremotos.

A maré mais conhecida é a maré oceânica, tão habitual aos freqüentadores das nossas praias. Este fenômeno consiste no movimento das águas sob o efeito das atrações mútuas do Sol e da Lua. Existe também a maré terrestre. Neste último caso trata-se da oscilação do nível da crosta terrestre em conseqüência da atração gravitacional lunissolar. Com o objetivo de esclarecer esta questão, procuraremos analisar os efeitos de maré dos planetas no Sol e na Terra.

Efeito de maré dos planetas sobre o Sol

O efeito da força de marés de um planeta sobre a superfície do Sol é diretamente proporcional  à massa desse planeta e inversamente proporcional ao quadrado da distância do planeta ao Sol. Em outras palavras, isso significa que um planeta de grande massa e dimensões gigantescas, como Júpiter, terá  a sua ação gravitacional reduzida por se encontrar muito distante. Essa é a razão pela qual a ação da Lua sobre as mares oceânicas é muito mais intensa do que a ação do Sol, embora a nossa estrela tenha uma massa muito superior à  da Lua. A reduzida distância da Lua à Terra aumenta a sua ação compensando a sua pequena massa.

Damos a seguir a intensidade em milímetros do efeito de maré de cada planeta sobre a superfície do Sol, quando a distância do planeta ao Sol é máxima, média e mínima:

Tabela III: Influência dos planetas sobre o Sol (em milímetro)

Planeta

Distância

máxima

Distância

média

Distância

mínima

Mercúrio

0,11

0,20

0,40

Vênus

0,44

0,45

0,46

Terra

0,20

0,21

0,22

Marte

0,0049

9,0064

0,0086

Júpiter

0,41

0,47

0,55

Saturno

0,020

0,023

0,027

Urano

0,00038

0,00043

0,00050

Netuno

0,00013

0,00013

0,00014

Plutão

0,000 000 19

0,0000004

0,0000009

Total

1,18

1,36

1,6 7

Se os planetas estivessem colineares e na menor distância do Sol, o efeito de maré seria na superfície solar de 1,67 milímetros. Valor insignificante para que a atividade solar viesse a variar.

Nota-se pelos valores da tabela acima, que os planetas que exercem maior influência sobre o Sol, em ordem de intensidade, são Júpiter, Vênus e Mercúrio. Assim, uma conjunção desses três planetas teria um efeito mais significativo do que a conjunção de Júpiter e Saturno, mesmo que adicionássemos a ação de Urano, Netuno e Plutão.

Considerando as marés produzidas por Vênus, Terra e Júpiter, o período de atividade solar deveria ser de quatro meses se alguma relação entre as manchas solares e a atração planetária realmente existisse. Por outro lado, o ciclo da atividade solar de 11 anos, mais exatamente 11,1 anos, e o período orbital de Júpiter de 11,86 anos parecem não constituir mera coincidência.

Essa idéia de que a atividade solar seria provocada pela atração dos planetas é uma velha teoria, muito bem estudada pelo meteorologista brasileiro Salomão Serebrenick (1909-1992), em tese definida perante a congregação do Ginásio da Bahia, para o provimento da cadeira de Cosmografia, em 1930.

Efeito dos planetas sobre a superfície da Terra

Assim como calculamos os efeitos de maré sobre a superfície solar é possível determinar a influência individual de cada planeta sobre a Terra no dia 10 de março de 1982, assim como no momento em que a distância desses planetas sejam as menores possíveis (quando a atração é mais intensa):

Tabela IV: Influência dos planetas sobre a Terra (em mm)

Planeta

Distância mínima

Mercúrio

0,000020

Vênus

0,024100

Marte

0,0011

Júpiter

0,0026

Saturno

0,000091

Urano

0,0000014

Netuno

0,00000035

Plutão

0,000000002

Total

0,028

 

Tais efeitos dos planetas sobre a superfície terrestre são desprezíveis comparados com efeito de maré produzido pela Lua e pelo Sol.

Efeito da Lua e do Sol sobre a Terra

Damos a seguir os valores da intensidade em milímetros da maré lunar e solar sobre a crosta terrestre quando ambos astros se encontram à maior,  à média e à menor distância da superfície da Terra:

 

 

Tabela V: Influência do Sol e da Lua sobre a Terra (em mm)

Astro

Distância à Terra

 

Maior

Média

Menor

Lua

304

356

422

Sol

156

164

172

A maré lunissolar será máxima nas luas Cheia e Nova (maré de sizígia), quando os dois astros se encontram alinhados com a Terra. Nesses dois momentos, a maré poderá atingir os valores máximos de 460 milímetros, quando os dois astros se encontram muito afastadas da Terra (apogeu), e de 594 milímetros, quando os dois astros se encontram muito próximos da Terra (perigeu). Esses valores comparados com os produzidos pela Lua evidenciam como são desprezíveis os efeitos produzidos pelos planetas em relação aos produzidos pela ação conjunta da Lua e do Sol.

Realmente, esses efeitos devem ser desprezados nos estudos, principalmente nas análises que visam a estabelecer métodos de previsão de terremotos, como vêm efetuando os cientistas norte-americanos, japoneses e chineses. Todas essas idéias parecem valiosas para a ciência. Convém discuti-las. Entretanto, procurar prever catástrofes com supostas "superconjunções" é, com efeito, algo bastante perigoso para o prestígio cientifico de quem o faz.

Extraído do Anuário de Astronomia 2000, editado pela Bertrand Brasil.

 

 

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