A procura de água na Lua

Ronaldo Rogério de Freitas Mourão

Na realidade até 1995, - quando a sonda Clementine descobriu prováveis depósitos de gelo, na cratera Aitken -, não haviam sido detectados indícios diretos e indiretos de água em qualquer região da superfície lunar. Apesar da conclusão das missões Apollo de que não existia água na Lua - pois todas as amostras estavam completamente secas, com exceção de algumas rochas, trazidas pela Apollo 16, que foram provavelmente contaminadas pela água da atmosfera terrestre - a esperança de encontrar água ainda permaneceu entre alguns astrônomos. Eles baseavam suas idéias em hipóteses relativamente antigas, segundo as quais deveria existir depósitos de gelo nas regiões próximas às calotas polares do nosso satélite.

A maior parte do nosso satélite recebe a luz solar durante 14,75 dias, a cada ciclo de fases de 29,5 dias. Existem montanhas nas proximidades dos pólos que recebem continuamente a luz solar em virtude do plano do equador lunar encontrar-se inclinado de somente 1,5° em relação ao plano do sistema solar. Em oposição a estas Montanhas de Luz Eterna, como as denominou o astrônomo alemão Johann Madler (1794-18740) em 1837, existem, nestas mesmas regiões polares, vales e fundos de crateras que jamais foram atingidos pelos raios solares. Nestes Vales de Trevas Eternas devem reinar temperaturas extremamente baixas. Elas constituem verdadeiras armadilhas, onde o frio polar pode capturar os vapores da água, ou mesmo reter os gelos, por milhões de anos.

Recentemente, em 1961, os astrônomo norte-americanos, Bruce Murray, Harrison Brown e Kenneth Watson, todos do Instituto de Tecnologia da Califórnia, propuseram um mecanismo que mostra como essas armadilhas geladas, onde reinam temperaturas de 173 graus Celsius abaixo de zero, podem reter água em estado de congelamento por toda a eternidade.

Depois de cerca de duas décadas das últimas alunissagens, o astrônomo norte-americano James Arnold, da Universidade da Califórnia, em San Diego, resolveu retomar os estudos dos seus três colegas sobre a origem provável de água na Lua. Para Arnold, a única fonte da água na Lua não estaria em seu interior. Elas poderiam ter origem também no impacto de meteoros ricos em água assim como no gelo dos cometas. Se por um lado Arnold defende essas duas novas origens para água, por outro lado ele explica que a Lua poderia tê-la perdido em consequência da radiação ultravioleta e do impacto das partículas atômicas provenientes do vento solar que poderiam destruir as moléculas de água ao desintegrá-las em átomos de hidrogênio e oxigênio, que facilmente escapariam da Lua em razão da fraca atração gravitacional do nosso satélite. A respeito dessas dúvidas sobre as reais origens e mecanismos de destruição da água lunar, Arnold esteve sempre convencido que os depósitos de gelo polar provavelmente existem. Ainda muito mais otimista, Arnold sugeriu a existência de água a uma profundidade de 2 metros, numa concentração de 1 a 10%.

Para o astrônomo Richard Hodger Junior, da Universidade do Texas, em Dallas, as crateras em forma de bacia com diâmetros inferiores a 20km devem produzir regiões de sombra permanente, situadas nas latitudes mais elevadas. Parece que tais crateras não permitiram um acumulo significativo de água nos pólos, em virtude de seu fundo estar permanentemente aquecido (acima de 100K) pela radiação infravermelha que envolve suas paredes. O contrário deverá ocorrer com as crateras com fundo plano. Segundo Hodges para este último tipo de crateras, situadas em latitudes superiores a 80 graus, devem existir superfícies nas quais a armadilha do frio deve agir de modo a conservar uma grande quantidade da água. Assim tanto para Hodges como para Arnold, um reservatório considerável de água deve estar ainda acumulado próximo aos pólos lunares. O grande problema é saber como detectar a existência real desses "lagos", muito difíceis de serem observados pelas sondas até hoje lançadas ao redor da Lua. Em 1967, os pólos norte e sul foram fotografados pela sonda Lunar Orbiter 4 e 5; mas pouco se pode observar em virtude de iluminação muito limitada dessas regiões, provocada pela incidência rasante dos raios luminosos nas zonas polares. Vinte e seis anos depois, mais precisamente em 9 de dezembro de 1992, a sonda Galileo fotografou a região polar norte da Lua. Todavia, assim como os orbitadores lunares, sonda Galileo não possuía sensores capazes de detectar a existência de lagos congelados nos pólos lunares. Agora, 35 anos depois da proposta da existência de água, feita por Bruce Murray, a sonda Clementine localizou prováveis depósitos de gelos. cratera de Aitken, na região polar sul da Lua. A cratera Aitken, situada do lado oculto da Lua, nas vizinhanças do polo sul, possui mais de 12km de profundidade e 52km de diâmetro. A temperatura nesta cratera varia de 20 a 230 graus Celsius abaixo de zero. Se existe gelo em Aitken deve existir em outros pontos do pólo sul da Lua, como aliás já suspeitavam vários pesquisadores, há alguns anos. A existência de gelo no fundo desta cratera é um indício de que a Lua deve possuir lençois substerrâneos, que poderão ser de grande utilidade às futuras missões colonizadoras. Esperemos que a próxima sonda a Lunar Propector confirme a existente destes depósitos, que reacendeu o velho sonho do homem colonizar o nosso satélite.



 

Publicado no Jornal do Commercio em 22 de dezembro de 1996

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